05 março 2007

O Sotaque das Mineiras

O sotaque das mineiras deveria ser ilegal, imoral ou engordar. Porque, se tudo que é bom tem um desses horríveis efeitos colaterais, como é que o falar sensual e lindo (das mineiras) ficou de fora? Porque, Deus, que sotaque!Mineira devia nascer com tarja preta avisando: “ouví-la faz mal à saúde.” Se uma mineira, falando mansinho, me pedir para assinar um contrato doando tudo que tenho, sou capaz de perguntar: só isso? Assino achando que ela me faz um favor.Eu sou suspeitíssimo.Confesso: esse sotaque me desarma.Certa vez quase propus casamento a uma menina que me ligou por engano, só pelo sotaque.
Os mineiros têm um ódio mortal das palavras completas. Preferem, sabe-se lá por que, abandoná-las no meio do caminho (não dizem: pode parar, dizem: "pó parar"). Não dizem: “onde que eu estou?”, dizem: "ôncôtô". Os não-mineiros, ignorantes nas coisas de Minas, supõem, precipitada e levianamente, que os mineiros vivem - lingüisticamente falando - apenas de “uais, trens e sôs”.Digo-lhes que não.
Mineiro não fala que o sujeito é competente em tal ou qual atividade. Fala que ele é “bom de serviço”. Pouco importa que seja um juiz de direito, um jogador de futebol ou um ator de filme pornô. Se der no couro - metaforicamente falando, claro - ele é “bom de serviço”. Faz sentido...
Mineiras não usam o famosíssimo “tudo bem”.Sempre que duas mineiras se encontram, uma delas há de perguntar pra outra: "cê tá boa?".Para mim, isso é pleonasmo. Perguntar para uma mineira se ela está boa é desnecessário.Há outras. Vamos supor que você esteja tendo um caso com uma mulher casada. Um amigo seu, se for mineiro, vai chegar e dizer: “- Mexe com isso não, sô’” (leia-se: sai dessa, é fria, etc). O verbo "mexer", para os mineiros, tem os mais amplos significados. Quer dizer, por exemplo, trabalhar. Se lhe perguntarem com que você mexe, não fique ofendido. Querem saber o seu ofício.Os mineiros também não gostam do verbo conseguir. Aqui ninguém consegue nada. Você não “dá conta”. Sôcê (se você) acha que não vai chegar a tempo, você liga e diz: “- Aqui, não vou dar conta de chegar na hora, não,sô.” Esse "aqui" é outro que só tem aqui. É antecedente obrigatório, sob pena de punição pública, de qualquer frase. É mais usado, no entanto, quando você quer falar e não estão lhe dando muita atenção: é uma forma de dizer, "olá, me escutem, por favor". É a última instância antes de jogar um pão de queijo na cabeça do interlocutor.
Mineiras não dizem "apaixonado por". Dizem, sabe-se lá por que, "paxonado com". Soa engraçado aos ouvidos forasteiros. Ouve-se a toda hora: "Ah, eu paxonei com ele...”. Ou: "sou doida com ele" (ele, no caso, pode ser você, um carro, um cachorro). Elas vivem apaixonadas "com" alguma coisa. Que os mineiros não acabam as palavras, todo mundo sabe. É um tal de "bonitim", "fechadim", e por aí vai. Já me acostumei a ouvir: "E aí, vão?”. Traduzo: "E aí, vamos?". Não caia na besteira de esperar um "vamos" completo de uma mineira. Não ouvirá nunca.
Eu preciso avisar à língua portuguesa que gosto muito dela, mas prefiro, com todo respeito, a mineira. Nada pessoal. Aqui certas regras não entram. São barradas pelas montanhas!Por exemplo: em Minas, se você quiser falar que precisa ir a um lugar, vai dizer: “- Eu preciso de ir...” Onde os mineiros arrumaram esse "de", aí no meio, é uma boa pergunta. Só não me perguntem. Mas que ele existe, existe. Asseguro que sim, com escritura lavrada em cartório. Deixa eu repetir, porque é importante. Aqui em Minas ninguém precisa ir a lugar nenhum. Entendam... Você não precisa ir, você "precisa de ir". Você não precisa viajar, você "precisa de viajar". Se você chamar sua filha para acompanhá-la ao supermercado, ela reclamará:”Ah, mãe, eu preciso de ir?” No supermercado, o mineiro não faz muitas compras, ele compra "um tandi côisa". O supermercado não estará lotado, ele terá "um tandi gente". Se a fila do caixa não anda, é porque está "agarrando" [aliás, "garrando"] lá na frente. Entendeu? Agarrar é agarrar, ora! Se, saindo do supermercado, a mineirinha deparar-se com um mendigo e ficar com pena, suspirará: “- Ai, gente, que dó."
É provável que a essa altura o leitor já esteja apaixonado pelas mineiras. Não venha caçar confusão pro meu lado. Porque, devo dizer, mineiro não arruma briga, mineiro "caça confusão". Se você quiser dizer que tal sujeito é arruaceiro, é melhor falar, para se fazer entendido, que ele "vive caçando confusão".Para uma mineira falar do meu desempenho sexual, ou dizer que algo é muitíssimo bom vai dizer: "Ô, é sem noção". Entendeu, leitor(a)? É sem noção! Você não tem, idéia do "tanto de bom" que é. Só não esqueça, por favor, o "Ô" no começo, porque sem ele não dá para dar noção do tanto que algo é sem noção, entendeu?
“Capaz”... Se você propõe algo e ela diz: “capaz!!!” Vocês já ouviram esse "capaz"? É lindo. Quer dizer o quê? Sei lá, quer dizer "ce acha que eu faço isso"!? Comalgumas toneladas de ironia... Se você ameaçar casar com a Gisele Bundchen, ela dirá: "Ô dó dôcê". Entendeu? Não? Deixa para lá. É parecido com o "nem...". Já ouviu o "nem..."? Completo ele fica: “- Ah, nem... “ O que significa? Significa, amigo leitor, que a mineira que o pronunciou não fará o que você propôs de jeito nenhum. Mas de jeito nenhum! Você diz: "Meu amor, cê anima de comer um tropeiro no Mineirão?". Resposta: "Nem..." Ainda não entendeu? Uai, “nem” é “nem”. A propósito, um mineiro não pergunta: "você não vai?". A pergunta, mineiramente falando, seria: "cê não anima de ir?". Tão simples. O resto do Brasil complica tudo. “É, ué, cês dão umas volta pra falar os trem...”
Falando em "ei...". As mineiras falam assim, usando, curiosamente, o "ei" no lugar do "oi". Você liga, e elas atendem lindamente: "eiiii!!!", com muitos pontos de exclamação, a depender da saudade... Tem tantos outros... O plural, então, é um problema. Um lindo problema, mas um problema. Sou, não nego, suspeito. Minha inclinação é para perdoar, com louvor, os deslizes vocabulares das mineiras. Aliás, deslizes nada! Só porque aqui a língua é outra, não quer dizer que a oficial esteja com a razão. Se você, em conversa, falar: Ah, fui lá comprar umas coisas... “Que' s côisa?” - ela retrucará. O plural dá um pulo. Sai das coisas e vai para o “que”. Ouvi de uma menina culta um "pelas metade", no lugar de "pela metade". E se você acusar injustamente uma mineira, ela, chorosa, confidenciará: ‘- Ele pôs a culpa "ni mim".’
A conjugação dos verbos tem lá seus mistérios em Minas... Ontem, uma senhora docemente me consolou: "prôcupa não, bobo!".E meus ouvidos, já acostumados às ingênuas conjugações mineiras, nem se espantam. Talvez se espantassem se ouvissem um: "não se preocupe", ou algo assim.
A fórmula mineira é sintética. E diz tudo. Até o "tchau" em Minas é personalizado. Ninguém diz tchau pura e simplesmente. Aqui se diz: "tchau procê", "tchau procês". É útil deixar claro destinatário do tchau.
Então...

7 comentários:

Anônimo disse...

eiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii =)

amei o texto!!! teve a manha total!!!!!!!!!! Sem base!

=) mas ainda nada se compara ao "primeira pedra"

Saudade docê!
bjao

Anônimo disse...

ahhhhhhhhhhhhhhhhhh gente,

nem notei que tava escrito em branquinho.

Aqui... sonhou o que???????

ai ai !
bjao

Carolina Vilela disse...

perfeito.
rolei de rir.

é do Veríssimo?

Ana Ziviani disse...

ei!!!!
navegando em blogs amigos cheguei até aqui. bacanérrimo seu blog :)
adorei o texto.

tchau procê! ;P

Roberta Nogueira disse...

Ei, Lu!
É verdade, hein, só nós temos esse sotaque...kkkkk!
Me identifiquei com cada mineirês!!!
Vou colocar esse texto no meu blog, ok? Claro, com as devidas referências!!
Grande Bjuu

Anônimo disse...

hahahhaa...
Aki amei o texto!!! Perfeitoo...
mineira é mineira...
bjs
thmy

Unknown disse...

aqui ! falá uma coisa pro cê esse texto é a mais pura das verdades!!! adorooo sou mineira com muito orgulho! tchau pro cê!!!obrigado