23 maio 2009

A Grandeza de Deus que leva à Ruína...



Sobre a Concepção Fundamentalista de um Deus Grande

"- Alá é grande!" é uma expressão de louvor comum entre os muçulmanos. Qualquer filme ou livro sobre o islamismo irá citar a frase. Não sei se é parte de alguma reza, se é algum credo próprio ou um versículo do Alcorão. Sei que a fé do Islã (e o fundamentalismo também) não têm dúvidas sobre a veracidade da verdade "Alá é grande!". O cristianismo e o judaísmo também pregam sobre a grandeza de seu Deus. O Yavé hebreu é muitas vezes retratado como um Deus terrível, o Poderoso Criador dos céus e da terra, Senhor Absoluto do Universo e Único Deus Verdadeiro. Não tolera outros deuses e muitas vezes puniu a infidelidade com espada, peste ou cativeiro. Os cristãos herdaram este Deus hebreu exclusivista, mas com a vantagem de tratá-lo por "ABBA" (aramaico: "Papai"). "Abba" era uma palavra aramaica muito especial dentro de seu contexto histórico. Era exclusiva para uso de filhos legítimos. Servos não podiam usá-la para se referir ao chefe da família, sob pena de morte. "Abba" é a palavra da intimidade no relacionamento de um Pai Amoroso e seus filhos. Implica em conversas leves e sinceras, riso fácil, perdão, correção, abraços e beijos. Falando assim, parece que o cristianismo "domesticou" (como diria C.S. Lewis) o Deus do judaísmo para poder tê-lo como Deus, mas não foi o que aconteceu... O Deus de Israel estava em inimizade com o homem por causa de Sua justiça e da traição humana e foi Ele mesmo que resolveu a pendência da justiça ao tornar-se homem e pagar o preço para restabelecer o relacionamento. O Criador tornou-se criatura. Infinitude e Eternidade limitaram-se no espaço e no tempo. Ao comentar sobre como este fato aconteceu, Paulo fala sobre "esvaziamento": "Seja a atitude de vocês a mesma de Cristo Jesus, que, embora sendo Deus, não considerou que o ser igual a Deus era algo a que devia apegar-se; mas esvaziou-se a si mesmo, vindo a ser servo, tornando-se semelhante aos homens" (Filipenses 2:6,7 - NVI). Deus escolheu abrir mão de sua grandeza e poder para tornar-se pequeno e frágil a fim de, assim, voltar a relacionar-se com suas criaturas e ainda dar-lhes o poder de serem mais: de se tornarem filhos Dele!(João 1 :12)

"Alá é grande!" inspira superioridade. Não me admira então a ocorrência do Jihad, a Guerra Santa contra os infiéis e incrédulos. O cristianismo também pode ser uma religião cruel se focar apenas na crença de que seu Deus é o único e verdadeiro e exaltar somente sua Grandeza. As Cruzadas provam isso. É verdade que houve motivação política da igreja, mas além da ambiçao de bispos e da massa popular manipulada, existiram monges e cavaleiros que realmente acreditavam que estavam lutando ao lado de Deus e fazendo Sua vontade. O apoio (ou mesmo o silêncio) da igreja católica relativo a séculos de escravidão do povo africano é outra face também da história da crueldade cristã. Até mesmo foi formulada uma teoria teológica para justificar as atrocidades: teólogos diziam que os negros era descendentes de Cão - o filho de Noé que viu seu pai nu quando se embriagou - e que deviam mesmo ser escravizados porque pesava sobre eles a maldição de Noé (Gênesis 9:20-27). Há ainda o terror Da Santa Inquisição, principalmente a espanhola, que condenou à fogueira milhares de pessoas inocentes ou que não se enquadravam no que a igreja cristã julgava ortodoxo. Para não falar somente do lado católico, vale lembrar que os puritanos ingleses puniam com humilhação pública o adultério (e até a suspeita dele) como pode ser visto no filme "A Letra Escarlate". Ou de como Calvinistas convictos perseguiram Anabatistas e algumas vezes até os forçaram a cometerem suicídio por causa de discordâncias de doutrina. Hoje a consciência e o "esclarecimento" da cultura moderna ocidental já não favorecem a incidência de um fundamentalismo tão brutal, mas ainda assim ele acontece dentro de muitas igrejas e seitas ditas cristãs sob a forma de legalismo e abuso espiritual. Há a imposição de usos e costumes de forma descontextualizada. Proibição explícita de práticas e convivências e discriminação de não-membros do grupo pretensamente com "base bíblica". Jesus andava com pecadores conhecidos, publicanos e prostitutas, mas muitos cristãos acreditam que só podem ser plenamente santos em companhia de outros cristãos e isolados de todo o resto. Por quê? A celebração da Grandeza e Santidade de Deus não pode excluir a celebração de Seu Amor. Se o imenso Amor de Deus é negligenciado no exercício da fé, a justiça se transforma em tirania e os líderes acabam tornando-se fanáticos militantes. Qual foi o conselho que Jesus deixou aos discípulos? "Vocês sabem que os governantes das nações as dominam, e as pessoas importantes exercem poder sobre elas. Não será assim entre vocês. Ao contrário, quem quiser tornar-se importante entre vocês deverá ser servo, e quem quiser ser o primeiro deverá ser escravo, como o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate de muitos". (Mateus 20:25-28, NVI). Serviço é algo que não é valorizado neste mundo, mas está em alta no Reino de Deus. Engraçado como os nomes dos principais líderes espirituais do nosso tempo não aparecem quando o assunto é servir. Servir não é ter um programa de audiência num canal de televisão, já foi provado que o percentual de pessoas alcançadas com este recurso é bem menor do que o esperado. Com o dinheiro gasto para sustentar um programa de televisão daria para sustentar muitos missionários em lugares onde realmente pudessem fazer diferença. Programa de televisão evangelístico acaba sendo visto só por crentes, não por quem deveria ouvir as boas novas... Serviço não é aparecer na igreja em dias de culto, ter uma cadeira de destaque no altar e pregar sermões motivacionais. Muitos gurus do meio corparativo vivem hoje de sermões motivacionais e nem por isso estão contribuindo para a obra de Deus. Não é ter o privilégio de celebrar casamentos ou de enterrar os mortos de uma comunidade, ou escrivãos e coveiros teriam reconhecimento espiritual. Serviço é lavar os pés dos outros. É ter o mesmo sentimento que houve em Jesus. Relacionar-se ombro a ombro com quem precisa. Compadecer-se com os que sofrem. Chorar com os que choram. Entender que misericórdia é mais importante do que sacrifício. Enquanto isso não ocorrer, a visão de um Deus Poderoso sem Amor irá criar a falsa ilusão em nosso coração que somos melhores que os demais e viveremos arrogantes cultuando nosso próprio umbigo e acreditando que estamos agradando a Deus.

Que Deus tenha misericórdia de nós enquanto confundimos Seus planos e designos eternos com satisfazer nossas podres ilusões de auto-imagem distorcida, enquanto olhamos para o Oriente e nos sentimos santos e perfeitos sem perceber nossas próprias mazelas... Que Deus nos torne menos xiitas, menos denominacionais, menos fundamentalistas e mais moldados de acordo com o Amor Dele.

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